13 de mai. de 2011

Lei Áurea

     “Falta de liberdade; sujeição, dependência, submissão, servidão, escravatura”. Alguns destes termos são diretamente jogados pelos grupos de discussão públicos e, de maneira mais consistente, no próprio agendamento da mídia. Quando citados eles sugerem uma forma antagônica à opressão, quebra da livre expressão, dominação, injustiça, dentre outros, podendo ser considerados como superficialidade diante à complexidade do que realmente é a escravidão. Mas, a maquiagem que envolve a face da sociedade moderna está realmente disposta a se aprofundar neste assunto? 

  Segundo o dicionário Aurélio, escravidão é um regime social em que um homem usa a força e a exploração sobre outro homem em busca de benefícios econômicos. Parece uma realidade aparentemente distante de nós, mas as estatísticas nos aproximam de um quadro bem diferente. Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) aproximadamente 12,3 milhões de pessoas vivem em regime de trabalho forçado em todo o planeta. Apesar da grande maioria dos “novos escravos” estarem na Ásia (9.490.000), em sua grande parte em indústrias de tijolos e minas chinesas, a América Latina convive com mais de 1,3 milhão de pessoas em regime de trabalho forçado. Na maioria dos casos, mulheres e crianças são as vítimas.

  Estima-se que o sistema escravista na sociedade moderna renda mais de US$ 31 bilhões aos exploradores.



A história geralmente nos ensina que no sistema escravagista o “dono” tem o poder de comprar, vender e até mesmo dar outro ser humano em busca de benefícios próprios. Nem sempre foi assim, em Esparta, por exemplo, os hilotas (população que habitava os domínios espartanos após as intensas batalhas) eram propriedade do Estado, mas não eram mercadorias. Podiam ser utilizados apenas na prestação de serviços aos cidadãos daquela cidade-estado. Porém, tal prática não foi comum com o decorrer dos séculos. Aprendemos que sempre a escravidão está ligada à superioridade étnica e ao preconceito racial.

No Brasil, os índios foram os primeiros a serem escravizados no contexto da colonização. A resistência dos mesmos dificultou o processo, até que o Marquês de Pombal proibiu a prática alegando que os gentis eram “pouco aptos” para o trabalho de exploração das riquezas naturais das terras recém-descobertas. A opção para tanto veio da África. Negros de Benguela ou do Congo eram os mais valorizados. Desta vez, os escravizados eram sim tratados como animais, onde era muito válida a prática do “olhar os cavalos pelos dentes”. Trabalhavam de 14 a 16 horas por dia (já pensou fazendo o mesmo serão?), usavam trapos (sem espaço para a Arezzo), comiam duas vezes ao dia (sem lanchinho de três em três horas) e, em caso de “desobediência” a punição ficava na base do açoite. Nem tudo era como a novela “Xica da Silva”.

    Já nos meados do século XIX vimos as mais consistentes formas de revolta, através do movimento quilombola. Mas apenas em 13 de maio de 1888 foi sancionada a Lei Áurea (Lei Imperial nº 3.353) por Dona Isabel, princesa imperial do Brasil (“feinha” como só ela). A Igreja Católica foi uma grande incentivadora da abolição, afirmando que tal feito seria um “bom presente” para o Papa Leão XIII. O áureo da Lei se deu por sua assinatura ter sido feita com canetas-tinteiro de penas douradas. Uma das três penas que serviram para a assinatura foi vendida recentemente por D. Pedro Carlos, bisneto da Princesa Isabel, ao Museu Imperial de Petrópolis, por R$ 500 mil. Buscava-se com o ato simbólico de determinar o fim da escravatura com uma caneta de ouro, evidenciar a importância de tal medida e como os negros poderiam ganhar o mesmo valor na sociedade brasileira das outras classes étnicas. Mas, nada tão brilhante aconteceu após a festa. Os negros viraram a escória do povo brasileiro e, hoje, são mais reconhecidos por feitos como a criação do samba e da capoeira (que, obviamente, são fatores de muito orgulho) do que em relação a seus feitos sociais e intelectuais. E não esqueçamos do futebol, é claro...

  Hoje o quadro é outro, a “prisão social” se dá pelo deslumbre e ilusão. Os grandes fazendeiros atraem jovens ambiciosos brasileiros, residentes em áreas de risco do país, oferecendo diversas vantagens de trabalho na lavoura. Cana, café, trigo, pecuária, minas de carvão, prostituição: diversas são as atividades em que os escravocratas dos anos 2000 obtêm vantagens sobre a vida do outro. 

  Daí você me pergunta de que forma esses métodos são praticados, se ferem gravemente tanto as leis deste país quanto a Declaração dos Direitos Humanos? O dinheiro, que motiva os propensos a uma vida melhor é o mesmo grilhão que os aprisiona. Aproveitando da ingenuidade e, na maioria das vezes, da falta de informação dos trabalhadores, os grandes empresários os fazem adquirir dívidas, desde o arroz à cachaça, completamente inflacionadas e, assim, os aprisionam até o cumprimento de um “contrato” que não existe e que não tem hora para acabar. Esses brasileiros voltam às senzalas, vivem mal, longe de suas famílias, até que, por ajuda da sorte, viram reportagem especial no “Fantástico” e, enfim, chocando com imagens fortes o mundo dos cegos, ganham a liberdade física. 

  A escravidão não foi abolida do mundo. Você já deve ter dito isso ao menos uma vez na vida. Mas já parou pra pensar a que distância ela está de você? Que coloca com tanto orgulho a Lei Áurea nos Trending Topics desta sexta-feira 13? Como reage a tudo isso? Colar figuras em cartolinas e copiar a biografia de Zumbi dos Palmares seria suficiente? Estaria você, tão perspicaz twitteiro, escravizado por alguma coisa? Preciso dar mais pistas?

    “Não alcançamos a liberdade buscando a liberdade, mas sim a verdade. A liberdade não é um fim, mas uma conseqüência”, Léon Tolstói.

#nosTrending:

@lucas_canuto Lucas Eduardo Canuto 
professor falou da Lei àurea, hoje dia 13/05, a 123 anos que acabaram-se os escravos e ai surgiram os estagiários. =]]

@RayanneBarreto 'Raah Barreto. 
lei aurea, sexta-feira 13... se passar um gato preto correndo na sua frente, não se assuste, não é azar. ele tá comemorando a liberdade.

@GarotaAdoradora Bianca Ramos Aurora 
abaixo assinado "Contra" o Trabalho escravo. Q mesmo com a "LeiÀurea" ainda permanece. http://www.trabalhoescravo.org.br/abaixo-assinado/

@winnii_e Winnie Silva 
Lei Áurea era feriado no Brasil até o Getúlio acaba com a festa --'

@geovaniapabulla Geovania Pabulla 
Fazem 123 anos que foi assinada a lei áurea, libertou os escravos mas não aboliu o preconceito!

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